Space Invaders | Nona Fernández 🇨🇱

No embalo da leitura de autoras chilenas, Space Invaders chegou para mim como uma grande curiosidade. Curto, intenso e cheio de nuanças, o livro mostra as muitas vozes, perspectivas e olhares de um grupo de adolescentes que vivem seus dilemas de como conduzir suas próprias vidas durante a ditadura de Pinochet.

Um dos primeiros lidos de 2023, Space Invaders só chega agora até vocês porque eu precisava elaborar algumas coisas. O livro tem uma beleza sutil, uma angústia dilacerante e uma narrativa que prende do início ao fim com seus curtíssimos capítulos.

O título, em alusão ao jogo de vídeo game, mostra as muitas formas de morrer, mesmo que a vida não seja uma brincadeira. Morrer socialmente, emocionalmente, enquanto sujeito, e morrer de fato. É preciso conservar a si e aos seus para que a jornada não seja interrompida de maneira abrupta pela repressão.

 

O fim da inocência da infância, a perda de amigos queridos, o pai de uma das garotas que se revela um torturador, as fraturas expostas da dor que dilacera. Um Chile que ecoa traumas e feridas, mesmo no núcleo afetivo de amigos que crescem juntos.

Nona Fernandez pontua com maestria as perdas, as ausências, as dissimulações e como certos erros não são ingênuos e não podem ser resetados. Achei muito perspicaz como a escritora costura acontecimentos reais com o grupo de amigos de um jeito inebriante.

No entanto, ainda que trate de tanta dureza, e de um desejo de lembrar apesar das ditaduras tão recorrentes na América Latina, a trama nos dá certo respiro e existe espaço para o riso, a descoberta do amor, o desencanto, o frio na barriga com o primeiro beijo, a potência da amizade e a força de fazer parte da história ao lado dos que sobreviveram.

 

Algo de noturno, metafórico e onírico emerge da narrativa impressionante pelos jogos entre simplicidade e camadas complexas que flanam entre a memória coletiva e individual das personagens. Para mim, é particularmente bonito que Nona Fernandes consiga mesclar a importância de narrar o trauma e não se deixar levar completamente pela crueza da vida. Algo meio parecido com a necessidade de dizer, mas sem perder a ternura.

Maldonado, Zúñiga, Fuenzalida, Bustamante, Riquelme, Donoso estão no centro nevrálgico da política e do afeto em que a narrativa fragmentária nos leva à figura de Estrella González, amiga que desperta fascínio, curiosidade e críticas. Uma narrativa de mergulho delicioso e surpreendente dela que é uma autora latina tão instigante, Nona Fernandez. 

Imensamente encantada e desejosa que Mapocho seja publicado no Brasil, assim como seus outros livros. Até lá, a ansiedade fica por ter nas minhas mãos o novo dela publicado pela Moinhos, A dimensão desconhecida.

 

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Sobre a escritora:

Nona Fernández é chilena de Santiago. Atriz, roteirista e escritora, ganhou prêmios por suas obras Mapocho y La Dimensión Desconecida. No Brasil, tem publicado Space Invaders e A dimensão desconhcida, ambos pela Moinhos.