Se deus me chamar não vou | Mariana Salomão Carrara

Hoje não é dia de #tbt, mas quero relembrar Se deus me chamar não vou, da Mariana Salomão Carrara, que saiu pela Nós.

Maria Carmem é uma menina de 11 anos, muito tamanho, e uma solidão dilacerante. Ela me lembra muito de mim pré-adolescente, aliás, descobri depois que o mundo está cheio cheinho de Maria Carmem nas minhas amigas, nas minhas irmãs, nas participantes do Leia Mulheres, nas ruas de São Paulo, nas ruas de Goiânia em todo lugar.

Maria Carmem é um retrato de um desamparo, de uma solidão, de uma tristeza que tem muito a ver com todas nós, porque a escrita, de alguma forma, quer dar conta desse processo doloroso e inevitável que é crescer.


Crescer e começar a perceber que o mundo nos desencaixa, nos desloca, nos coloca em lugares e situações que precisamos lidar para que possamos encontrar jeitos de existir.

Oscilei entre a identificação, o choro livre e um pouco de riso. Com uma dicção que nos faz mesmo acreditar que o livro é escrito por uma menina de 11 anos, Mari Carrara nos conduz por temas muito importantes, como o bullying, os padrões comportamentais que nos massacram desde cedo, a afetividade, o desencaixe, e de alguma forma também trata de como o esquecimento, o envelhecer, pode ser muito assustador na medida em que você pode até precisar de peças de reposição, mas não é uma máquina.

É também um livro metalinguístico, metaliterário, afinal, Maria Carmem é escritora, e ela tem planos em relação a isso. Ela arquiteta, ao longo da narrativa, um jeito de se fazer notar como uma romancista, vemos a estruturação de suas ideias, de seu projeto. O livro também é sobre o processo solitário da escrita e nós, leitores, somos cúmplices da narradora, somos seus interlocutores.

Maria Carmem nos abre seu diário, sua rotina, suas angústias, para que possamos compartilhar com ela todos os sentimentos. E eu adoro um diário (como leitora, não escritora), adoro a escrita que se debruça nos meandros da casa, das relações, que revela os detalhes do que não é dito, do que temos medo de expressar, daquilo que fica nos cantos, arrastado para debaixo dos tapetes.

É preciso dizer, pois muita coisa se acumula, machuca, maltrata, porque não conseguimos expor tudo o que sentimos. Ou também porque não encontramos espaço e escuta. Belíssimo, principalmente porque é um livro que nos dá esperança.

Terminei a leitura com o coração aos pulos, sobressaltada, apaixonada e numa felicidade tremenda. Eu só realmente me entrego ao fato de que a literatura, essa catarse, me faz olhar pra dentro e entender que a cura é um jeito de escrever que transforma. Acho tocante como a narradora nos conduz, nos faz acreditar nessa ligação poderosa de identificação.

Prepare o coração para essa leitura poderosa, você não vai se arrepender.

 

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Sobre a autora:

Mariana Salomão Carrara é brasileira de São Paulo. Escritora e defensora pública, ganhou prêmios como o Off-flipe e o Josué Guimarães. É autora de Delicada uma de nós (Off-Flip), Fadas e copos no canto da casa (Quintal Edições), Se deus me chamar não vou e É sempre a hora de nossa morte amé (Nós) e Não fossem as sílabas de sábado (Todavia)

 

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