Casas Vazias | Brenda Navarro 🇲🇽

 

Desde que o meu filho nasceu eu tenho medo de perdê-lo. Não sei se é assim com todas as mães, mas comigo é. Não sei se porque perdi um filho na barriga antes dele ou se porque quando decidi que queria ser mãe contradizendo os nãos-desejos de uma vida toda, aí eu quis muito mesmo, junto com meu companheiro, que Tito viesse ao mundo. 

 

E, de alguma forma, Brenda Navarro (nunca te vi, sempre te amei) traduziu isso e muito mais em Casas Vazias, livro publicado pela deliciosa da Dublinense. 

 


São tantos olhares pra maternagem neste livro que é, sem dúvida, um dos mais belos e sensíveis que li nos últimos tempos. Fui às lágrimas diversas vezes tentando encontrar palavras possíveis para me descrever lendo este texto. 

 

Aqui, todas as mães são vítimas de uma sociedade perversa, dura, que nos massacra. Sociedades que dizem amar mães, mas que viram as costas para elas quando elas mais precisam. Não existem maniqueísmos sabe. E isso é de um brilhantismo profundo. Os homens? Bem, eles são simplesmente insuportáveis e qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência em uma país de pais que abandonam mulheres e crianças como se estivessem num jogo de azar.

 


Uma criança desaparece. A mãe que a perde experimenta a dor profunda dessa ausência, já tendo experimentado tantas outras que se impõem contra ela. A que sequestra também é uma mulher violentada pela vida, pelo companheiro, e que vê neste bebê a esperança de se fazer mãe, de se fazer gente, de existir. 

 

No entanto, Daniel/Leonel é uma criança atípica e o livro nos dá os contornos destas maternagens complexas, solitárias, desafiadoras em que estas mulheres, além de sofrerem preconceitos dos que estão à sua volta, têm de lidar com as profundas dores causadas pelo estresse desses processos de cuidado. 

 

 


 

Narrado pelas duas mães, que se espelham e se encontram no processo de maternar, vamos conhecendo suas histórias, cheias de contradições e que denunciam os abismos sociais imensos entre elas, mas também as fraturas e os avessos. 

 


E assim, outras mães  aparecem no texto. A que a filha foi assassinada pelo marido; a que perdeu o filho na construção e cuja filha é fruto de um estupro; a que é incapaz de se solidarizar com a dor de uma outra mãe; a assassina; as extremamente violentas e más; as carinhosas e exaustas. São tantas, se encontrando e se misturando, e tão fraturadas que não dá pra não querer abraçar todas elas e dizer que nessas dores e intensidades também nos hermanamos. 

 

Se eu tivesse lido Casas Vazias há 7 anos atrás só teria achado um livro espetacular e incrível, mas lendo na virada do ano de 2023, como mãe do Tito, um menino tão amado e desejado por mim e meu esposo, eu acho o livro ainda mais fenomenal. 

 

 

Com uma narrativa pulsante, de encher os olhos de água e nos limites dos sentimentos, Brenda Navarro nos presenteia com um livro poderoso e que ousa mostrar a maternidade com todas as suas tensões, sem romantismos, desmoronando, desconstruindo construtos perversos: a dor, o amor, o medo, a depressão pós-parto, os desesperos, as euforias, os desafios, as culpas e as felicidades também.  

 

Sufocadas, essas duas mulheres estão no limite, sem conseguir respirar e ñós, sem fôlego, estamos entregues a essa narrativa potente e arrebatadora. Brenda entenda, vc é simplesmente maravilhosa e esse livro é perfeito.

 

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Sobre a autora:

 

Brenda Navarro é mexicana da Cidade do México. Socióloga, economista e escritora, é ativista pelos direitos humanos e está intimamente envolvida com a promoção e incentivo da escrita de mulheres. Escreve contos, poemas, romances. Ganhou o prêmio Tigre Juan por Casas vazias. Além de Casas Vazias, tem publicado no Brasil Cinzas na Boca. 



 

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